quarta-feira, 16 de outubro de 2019

“O maluquete de palestra agora virou ministro”, diz escritor que teve livro censurado em escola de SP

Reprodução/Facebook/FlicaOficial
Dedicado a descrever nossas agruras sociais e políticas no projeto “Diário da Catástrofe Brasileira”, o escritor paulistano Ricardo Lísias acabou tragado nos últimos tempos para uma realidade de traços nonsenses. Um universo de situações que seriam inimagináveis nos anos recentes.

Com quase duas dúzias de livros publicados, um prêmio São Paulo de Literatura e um conto selecionada pela revista inglesa “Granta” que reuniu os melhores escritores jovens brasileiros, Lísias foi censurado. O autor teve uma obra impedida de ser lida em uma escola particular do ABC Paulista.

Os desdobramentos dessa censura vão desde a demissão de um professor que tinha grande aceitação pelos alunos até a confissão de que o livro foi impedido sem sequer ser lido. Tudo isso intercalado de cenas tragicômicas. Em entrevista ao Yahoo Notícias ele conta mais sobre essa história e sobre como tem relacionado sua produção literária com o Brasil de 2019.

Yahoo Notícias
: Como é ser um escritor no Brasil de 2019? A realidade supera a ficção?

Ricardo Lísias: Pois é. É uma pergunta que tem surgido um pouco por aí agora. Muita gente tem dito que a realidade se tornou inimaginável. E talvez isso tenha algum sentido. Chegamos em uma situação em que não conseguimos acreditar que isso chegaria. Vivi algumas situações no ano passado em que as pessoas me falavam... ‘Não... Isso não vai acontecer’... ‘Não chegaríamos a esse ponto’. A imaginação não alcançou. Ninguém conseguiu prever isso. Mesmo a não ficção. Estudos e análises apontavam que não chegaríamos a esse ponto. A gente já chegou e está ultrapassando. A vida ficou muito difícil. No campo específico da literatura... Nos eventos que eu vou percebo que já existe autores com certo medo. Existe uma autocensura. Existe também um estrangulamento financeiro. Eventos pararam de receber verbas e as coisas passaram a ficar burocraticamente difíceis de propósito.

Yahoo Notícias: Como surgiu o projeto “Diário da Catástrofe Brasileira”?
Ricardo Lísias: Veio de um pouco disso. De eu ficar... Eu também fiquei espantado. Eu fui uma das pessoas que não imaginou exatamente isso. Venho trabalhando com essa decadência ideológica e os problemas sociais do Brasil, mas também fiquei pensando se chegaríamos a esse ponto de destruição e decadência. Você lembra daquela matéria da Folha de S. Paulo que pelo que eu vi vem sendo cada vez mais confirmada que retratava os disparos em massa de coisas pelo WhatsApp. Eu li aquela matéria e fiquei bastante curioso de saber o que essas pessoas compartilhavam. Eu pensei... Bom as pessoas estão compartilhando coisas pelo WhatsApp, mas o que elas estão compartilhando? E eu entrei nesses grupos e fiquei completamente chocado. São coisas muito violentas. Muito racistas. Coisas profundamente misóginas. E enfim... Desde aquele dia eu comecei a juntar informações. Uma informação aqui e outra ali e percebi que existe uma certa coerência nesse pensamento. Não é uma coisa desordenada. É uma coisa que tem uma ordem inclusive estética. Comecei a escrever no dia que saiu o resultado das eleições e depois de algum tempo percebi que eu deveria publicar. E optei por esse formato do ebook transformável porque uma das coisas que eu reparei é que essa ideologia é mutável. As pessoas vão e falam uma coisa. Depois já falam outra. Voltam atrás. Criam verdades que não duram 15 minutos. Percebi que precisava de um formato em que eu pudesse modificar as coisas.

Yahoo Notícias: Vivemos uma época de extremismo sobretudo na política. Como tem sido as reações aos “Diários da Catástrofe Brasileira”?
Ricardo Lísias: O número de leitores está crescendo. Vem aumentando aos poucos. Tem as agressões de hábito. Não dá para dizer que o assédio é muito grande, mas de vez em quando aparece um maluco para despejar toda aquela clichezada deles todos. O que aconteceu foi que eu recebi uma proposta para que eu organizasse dentro do que já foi publicado textos que fossem mais perenes. E eu vou publicar pela Editora Record entre março e abril do ano que vem. Será uma espécie de última redação daquilo que já se cristalizou.

Yahoo Notícias: O senhor já foi processado por Eduardo Cunha por conta do livro “Diário da Cadeia”. Em que pé anda esse processo?
Ricardo Lísias: É um projeto experimental. Escrevi um romance retratando os primeiros meses do ex-deputado Eduardo Cunha preso. O que eu fiz de diferente foi que eu assinei com o nome do Eduardo Cunha. Com o nome da personagem. Só que eu avisei na capa do livro. Deixei bem claro que se tratava de um pseudônimo. Ele não ficou exatamente satisfeito e entrou com um processo na justiça fazendo um milhão de acusações. E ele conseguiu recolher o livro. Ele não avisou para a juíza que estava escrito pseudônimo na capa. E ela tomou uma decisão muito rápida. Uma decisão liminar. O livro ficou recolhido durante 20 dias, mas aí a minha advogada e os advogados da editora entraram com recurso e nós ganhamos. Depois ele recorreu e nós fomos vencendo os recursos. O caso chegou ao Supremo e o Supremo me deu razão. Minha tese é que o nome da obra faz parte da obra. É um livro ficcional e a tese foi aceita. A questão é que eu entrei com um processo contra o Eduardo Cunha. Um processo contra ele por destruição de obra de arte. Quem causou a quebra do pseudônimo foi ele. A mentira que ele contou para a juíza. Esse processo está na fase final da primeira instância e a juíza pode dar a sentença a qualquer momento.

Yahoo Notícias: Como o senhor define a relação entre literatura e política? Ela tem mudado com o tempo?
Ricardo Lísias: Sim. Até porque a própria questão política muda. As duas instâncias mudam. Tanto a política como a literatura. Sempre foi uma relação muito conflituosa. Muito problemática. Eu acho que a literatura está inserida na vida social. O livro ocupa um determinado espaço. Foi o que eu quis fazer com esse livro com o nome do Eduardo Cunha. Eu queria fazer um ato de provocação política. Eu acho que os livros podem se inserir em uma determinada situação social e essa situação social também se faz presente no livro. Se a consequência dessa sua pergunta fosse se a literatura deu conta dessa realidade? Da situação política atual? Aí eu acho mais problemático. Eu tenho uma tese que é difícil de defender. Estou escrevendo sobre isso nesse momento. Eu acredito que sociedades que produziram certo tipo de literatura conseguem produzir acordos que impedem que a extrema direita não chegue ao poder. Notei que sociedades que já aboliram ou que nem se preocupam tanto com o gênero literário. Que explodiram a diferença entre gêneros conseguem apresentar um pouco de resistência como no caso da literatura francesa. A gente ainda eu acho que ainda não. Talvez atualmente a gente esteja chegando em um ponto de reação. Não estamos nesse grupo que tinha também uma arte muito pouco presa a lastros e fronteiras. Você repara que durante a nossa eleição as fronteiras foram mantidas. Alguém de centro jamais apoiaria alguém de uma esquerda mais radical. Ninguém quis fazer uma frente ampla de defesa contra o candidato de extrema direita e aí deu no que deu.

Yahoo Notícias: O senhor teve recentemente o livro “Céu dos Suicidas” (Alfaguara, 2012) censurado em uma escola. Conte sobre esse caso?
Ricardo Lísias: É um caso muito surpreendente. Ao contrário do que as pessoas pensam o “Céu dos Suicidas” é meu livro mais vendido. E isso acontece porque ele é adotado em sala de aula no ensino de jovens entre 15 e 18 anos. E essa história é muito maluca. Um professor tentou adotar o livro no terceiro ano do ensino médio de uma escola particular do Sistema S. É uma escola do Sesi de Santo André. Algo normal. O livro já foi adotado por outras escolas. Até pelo próprio Sistema S em Santo André quando eu estive lá em 2014. Esse professor colocou o livro em uma listagem dos livros que seria passado para os alunos. Quando a lista chegou na coordenação pedagógica, a coordenadora chegou nesse professor e disse que não permitiria aquele livro. Ele perguntou o motivo e ela não deu explicações muito claras. Pelo que eu entendi esse era um dos conflitos desse professor com a escola. Passaram a aparecer outros conflitos e ele foi demitido um mês depois. Eu fiquei sabendo meses depois quando alguém me marcou no Twitter falando sobre o caso. Eu fiquei interessado em saber do que se tratava. Quando conheci a história eu percebi quanto tudo aquilo era nonsense. Os alunos da escola quando viram que eu estava interessado no assunto começaram a me mandar testemunhos sobre o quanto eles consideravam esse professor. É um professor que tem um grau de aceitação dos alunos muito acima da média.

Yahoo Notícias: Mesmo se tratando de adolescentes...

Ricardo Lísias: 
Exato. Ainda mais se tratando de adolescentes. Vinha aluno falando que esse professor tinha mudado sua vida. Eles faziam até meme com o rosto deles rindo com o antigo professor e deles chorando com o novo. Eu devo ter uns 100 testemunhos de aluno exaltando esse professor. Ex-aluno que dizia que entrou na faculdade por causa dele. Eu fiquei achando que havia alguma coisa muito errada nisso aí. Porque é um livro adotado por muitas outras escolas. Não é um livro polêmico. Eu tentei entrar em contato com a escola. E o que a escola me faz? Me coloca uma inspetora para me seguir no Twitter. Os alunos vieram que avisar que essa seguidora era inspetora da escola. Que queria saber do que estávamos falando. Daí eu fui falar com ela. Passei o meu e-mail e disse que queria conversar com a escola. Nunca fui respondido. Eu já tinha contato com uns 20 adolescentes e comecei a ficar irritado. Daí tive a ideia de pedir para eles anotarem em uma lista o nome de todo mundo que queria ler o livro que eu mesmo compraria para doar. Acabou que a editora a Companhia das Letras acabou doando metade e eu comprei a outra. Nessa época eu era bastante ingênuo. Como as conversas eram todas abertas eu pensei... Pô a inspetora vai ver e eles vão falar comigo quando eu for lá. Parecia o óbvio. Chego na porta da escola e as únicas pessoas que se aproximam de mim são os próprios adolescentes. Eles pegaram as duas caixas de livros que eu havia autografado com o nome de cada um. E eles foram me narrando uma série de barbaridades.

Que eles não puderam se despedir do professor. Que ele era realmente bom. Que era o único que se preocupava com eles... E depois de distribuir os livros eu fiquei parado na porta da escola e ninguém veio falar comigo. O que eu fiquei sabendo depois... Veja só. Parece um pouco aquela fábula de que a roda da bicicleta quebra e ele vai trocar a roda da bicicleta e suja a mão de graxa. Depois tenta limpar a graxa na camiseta e suja a camiseta. Depois passa a camiseta no rosto... Enfim, eles foram piorando a situação mais e mais. Depois eu descobri que a escola convocou os pais para dizer que não tinha nada a ver com o livro que estava sendo distribuído na porta da escola. O resultado disso é que o Diário do Grande ABC ficou sabendo da história. Os alunos são muito inquietos e o assunto passou a ser discutido na banca de jornal. E os alunos de outros anos passaram a querer o livro também. O professor só tinha indicado para o terceiro ano. O assunto chegou ao jornal. Um jornalista me procurou. Eu contei a história e ele foi entrevistar as pessoas da escola. E a coordenadora declarou que proibiu a leitura do livro por causa do Massacre de Suzano. Ela achou que usar um livro que tinha suicídio na capa poderia estimular o suicídio dos alunos em um momento frágil.

O meu livro foi publicado em 2012. Não tem nem a mais remota ligação com o caso de Suzano. E ela ainda declarou a esse repórter que não leu o livro. Ela impediu um livro de ser lido sem sequer ler. Existem alguns casos de proibição de livros no Brasil. Eu sou contra todos eles. Acho que isso mão pode ocorrer. Só que nos outros casos as pessoas ao menos tinham lido sabe. A pessoa olhou a capa do meu livro e achou que ele poderia estimular o suicídio. Quando é o contrário. O livro é muitas vezes adotado no setembro amarelo justamente para prevenir o suicídio. E a situação se tornou ainda mais nonsense com os alunos tirando uma quantidade gigantesca de sarro, uma inspetora me seguindo para saber o que eu escrevo... Perguntei para ele se queria mandar uma cartinha para minha mãe. Então finalmente a coordenação regional do Sesi lá no ABC me chamou para uma reunião. Eu conheço pouco o professor. Falei algumas vezes com ele no Twitter e troquei três e-mails com ele. Até porque eu achava que existia algo muito grave. Esse cara é um campeão de elogio e foi demitido? Perguntei se ele foi demitido por justa causa e ele me disse que não. Que foi demitido por incompatibilidade. Ou seja. Ele não fez nada grave. Eu fiquei chocado com a situação. Como um professor indica meu livro e perde o emprego por causa disso. Enfim, eles me chamaram para a tal reunião. Chego na reunião e encontro o coordenador regional do Sesi, a diretora da escola e o coordenador pedagógico do Sesi. Então eu notei o que realmente aconteceu.

Não sei se eles perceberam que eles criaram um conjunto autoritário ali. Eles me chamaram lá para me explicar como eu deveria encarar a situação. Eles começaram a tentar me explicar o mundo... É exatamente a raiz do autoritário. O autoritário é aquele que diz para o outro o que está acontecendo. Disse para eles com muita clareza que tenho dezenas de testemunhos que falam do brilho desse professor em sala de aula e eles não estão levando em conta a opinião dos alunos. Só que o autoritário não ouve o outro né. Os caras não ouvem ninguém. Perguntei por que a inspetora da escola estava me espionando. Eles não souberam explicar. E depois que eu disse que a solução mais assertiva seria recontratar o professor o coordenador pedagógico começou a rir e perguntou se eu era advogado do professor. Quer dizer. Pessoas autoritárias não gostam de advogados. O autoritarismo de imediato tenta suspender direitos individuais. Eu fiquei puto e fui embora. Daí eu notifiquei o Ministério Público porque essa atitude fere a Constituição é contrária ao Estatuto da Criança e Adolescente e os Direitos Humanos. A Constituição garante a pluralidade pedagógica dentro da sala de aula. O Eca garante que a criança ou o adolescente seja ouvido pelos seus interesses. E os Direitos Humanos garante a liberdade plena da troca de ideias. Também notifiquei a comissão dos Direitos Humanos da Câmara de Vereadores de Santo André e da Assembleia Legislativa de São Paulo. Também notifiquei a Coordenação Nacional do Sesi. Isso me preocupa muito. É uma escola né. Nesse caso específico em momento algum escorreu alguma coisa sobre esquerda ou direita. Isso me deixou mais chocado porque é um caso que foi um pouco além já que o veto não se deu sequer por razões ideológicas. Qual o próximo passo?
Yahoo Notícias: Qual a sua opinião sobre o projeto “Escola Sem Partido”?
Ricardo Lísias: Esse movimento é uma coisa sem pé nem cabeça. É um movimento que não tem o menor sentido já que quando qualquer pessoa faz uso da linguagem ela tem uma manifestação ideológica. Isso em qualquer situação e em todas as matérias. É um movimento que pretende que a escola seja apenas representante da ideologia dos membros desse movimento. O que me parece é que eles estão tentando trazer medo. Eu poderia ficar com medo de denunciar essa situação. Se eu tivesse ficado com medo essas pessoas teriam sucesso. Interessa que haja medo. Porque o medo não permite a reação. E eles querem causar medo em um ambiente muito sensível para a sociedade que é a escola. E isso não pode prevalecer. E ao que tudo indica a justiça não vai permitir isso. E as vezes a gente assiste atos de barbaridades como no caso do governador de São Paulo que tentou censurar uma apostila por uma definição de gênero que é completamente natural. Que é usada no mundo todo. Só que eles resolveram criar um caso enorme para deixar todo mundo com medo. O fundamento do Escola Sem Partido é deixar as pessoas temerosas. O professor já é uma profissão delicada no Brasil porque sempre foi destratada. Nunca ganhou o quanto merece... No caso do ensino de história, por exemplo, eles querem reescrever a história. Quando se afirma que existiu tortura na ditadura militar e que houve ditadura. Isso não é uma declaração de direita ou esquerda. É uma declaração de um fato histórico documentado. As pessoas querem apagar isso –e hoje a gente já sabe-- porque elas querem que a tortura continue.

Yahoo Notícias: Qual a sua opinião sobre o autoproclamado filósofo Olavo de Carvalho?
Ricardo Lísias: Então... Eu acho inúmeras coisas. Primeiro é muito fácil ficar distribuindo impropérios em outro continente. Isso é muito confortável. É muito cômodo. Há uns dez anos atrás alguns autores se reuniam aos sábados para tomar café e conversar. Um escritor chegou e mostrou um artigo desse senhor em um grande jornal. Era um texto completamente sem noção dizendo que o Brasil estava prestes a se tornar um país comunista. E esse escritor disse que esse tipo de ideário era muito perigoso porque poderia se espalhar. Eu pedi para ler o artigo e achei que aquilo ali não tinha a menor possibilidade de vingar. Foi um grande engano meu. Agora depois da eleição eu fui ler “O Que Você Precisa Saber Para Não Ser Um Idiota”. É um livro que não consegue nem encadear parágrafo direito. É uma série de acusações e xingamentos. Uma pessoa como essa atingir tal popularidade me parece ser um pouco um sintoma de nossa miséria. Eu tenho a impressão que se fosse mais fácil ter acesso a filosofia dez anos atrás... Não é como na França que você chega e uma banca e tem oito revistas de filosofia. Ele preencheu um pouco esse buraco. Não com filosofia porque ele não consegue sequer concatenar argumentos. Aquilo ali não é um pensamento ordenado. Ele encarna também um pouco dessa tendência da vulgaridade que tomou conta da sociedade brasileira. Vi dois ou quatro vídeos dele nos últimos tempos e ele fala muito palavrão né. Tem uma fixação anal muito grande. Ele se apropria um pouco também do moralismo brasileiro.

Yahoo Notícias: Uma das últimas polêmicas do governo envolveu um dos grandes nomes das artes brasileiras. O presidente Jair Bolsonaro deu a entender que não iria assinar o diploma do Prêmio Camões –o maior em língua portuguesa. Como enxerga isso?

Ricardo Lísias: Olha... O Chico Buarque não precisa disso. Ele está em outra dimensão. Essa foi mais uma demonstração de orgulho da própria ignorância. Eles têm orgulho da própria ignorância. O Chico não precisa disso. Você colocaria a assinatura do Bolsonaro na sala? Se ele assinasse iria estragar o diploma. Melhor não ter assinado mesmo.

Yahoo Notícias: Ainda sobre o prêmio Camões. O escritor Raduan Nassar que concebeu algumas das maiores obras da literatura brasileira no último século protagonizou polêmica ao criticar duramente o impeachment da presidente Dilma e o governo do presidente Michel Temer. Ele criou uma saia justa na entrega do prêmio e acabou sendo muito criticado por algumas pessoas. Esse caso marcou uma escalada desses ataques recentes a cultura?

Ricardo Lísias: Não resta dúvida. A sociedade brasileira sempre teve muita dificuldade com a transgressão. E muitas vertentes da literatura são transgressoras. Os livros do Raduan Nassar são transgressores não só em relação a linguagem, mas em todas as ordens possíveis. Enquanto havia ainda um certo nível de civilidade. Uma civilidade precária sendo resguardada pelos governantes... Nem os generais tinham coragem de falar o que o Bolsonaro fala. O discurso da ONU foi um completo desvario intelectual. É um amontoado de absurdos que ele foi lá e falou tranquilamente. E depois ainda defendeu. Você veja a Fernanda Montenegro, por exemplo, que vem sendo agredida recentemente por um desses representantes do obscurantismo. Eu tenho bastante experiência em participar de eventos literários. E nesses eventos tinha sempre um autor obscuro que levantava a mão e na parte da fala dele ele falava algo como “para mim esse Graciliano Ramos não é tudo isso não” ou “esse Guimarães Rosa não presta”. A Fernanda Montenegro é para as artes cénicas o que o Graciliano Ramos é para a literatura. Isso é um ponto pacificado. Sempre tinha esse cara. O problema é que esse cara agora virou ministro. Ou assessor de ministro. O maluquete de palestra virou ministro. Antes quando alguém falava esse tipo de bobagem a plateia ficava sem graça. Você sentia vergonha alheia... Agora o cara que fala isso vira diretor da Funarte. Esse é o nosso atual estado. Deram o poder para os caras que nunca conseguiram sobressair por absolutamente nada e ficavam ressentidos por isso. E eles inventam que não se sobressaem porque não são de esquerda. E isso é mentira. Eu de cabeça consigo lembrar de oito ou dez que se destacaram. Inclusive na literatura contemporânea. É argumento de gente sem talento mesmo.





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